N. 6 (16 de Janeiro de 1913)
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O presente trabalho assume visibilidade na sequência da investigação realizada no âmbito do Seminário Livre de História das Ideias, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e do seu projecto Revistas: Ideias e Cultura (1900-1930), coordenado por Luís Crespo de Andrade e Zília Osório de Castro. Procedi, ao longo de dois anos (2001-2003), a um estudo sistemático dos 226 artigos da revista Vida Portuguesa e elaborei uma grelha conceptual e onomástica para cada artigo. De acordo com o protocolo feito com a Biblioteca Nacional de Lisboa e com a Fundação Mário Soares, realizou-se a digitalização da revista “renascentista” e a disponibilização das respectivas 226 fichas analíticas no sistema PORBASE (em 2003), que nunca foram publicadas, e que passam a estar ao dispor, de futuros investigadores, ou meros curiosos neste blog[1].
A análise da Vida Portuguesa, impõe-se de forma a aprofundar a nossa compreensão de “um dos momentos mais fecundos e prospectivos do génio português”[2], ou seja, a «Renascença Portuguesa». A insuficiência de estudos científicos sobre esta revista, na altura, inseridos sempre num contexto mais alargado que é o do «movimento renascentista» e dos seus fautores, levou-nos à escolha desta revista.
A apresentação de uma revista e semear algumas pistas, na esperança de uma colheita frutuosa, são os objectivos pretendidos nesta análise. .
Geração Nova: corte de inflamados guerreiros[3]
A apropriação desta frase de Cortesão, a iniciar o capítulo sobre os actores presentes no palco da revista Vida Portuguesa, surge por albergar a heterogeneidade do movimento “Renascença Portuguesa”. Sintomática de duas realidades diferentes, por uma lado uma nova geração que pretende um Portugal cosmopolita e moderno, integrado na Europa[4], por outro uma geração de “inflamados guerreiros” cujo principal objectivo é “reintegrar a alma da nossa Raça na sua pureza essencial, revelar o que ela é na sua pureza originária, para que tome conta de si própria, e se torne activa e criadora, e realize, enfim o seu destino civilizador”[5]. Reveladora também de uma atitude de compromisso por parte do fundador da «Renascença Portuguesa», e que terá o seu corolário na própria Vida Portuguesa.
Em comum o grupo de Lisboa e o grupo do Porto tinham desde 1911 a mesma esperança: o renascimento nacional. O fim deste projecto seria a promoção “da cultura do povo português”, utilizando como instrumentos privilegiados na sua demanda a conferência, o manifesto, a revista, o livro, a biblioteca e a escola.
Em Outubro de 1912 Jaime Cortesão, director de Vida Portuguesa, cercou-se de um conjunto de homens, cujos saberes iriam marcar as estratégias e definir a dinâmica desta, em paralelo com o órgão de propaganda da «Renascença Portuguesa», A Águia. Os objectivos do quinzenário são traçados na reunião de 2 de Junho: promover inquéritos a personalidades especializadas na área religiosa, educativa, social e económica[6], de forma a arranjar soluções para estes problemas, “tentando resolve-lo, em harmonia com o espírito moderno, e especialmente em conformidade com as necessidades actuais e o original espírito da Pátria Portuguesa”[7]. Em conformidade com a própria agenda do movimento que originou este boletim, e com o ex-libris daquele – “promover a maior cultura do povo português” – a direcção da revista vai divulgar todas a obra renascentista, quer seja a acção editorial (as bibliotecas “Renascença Portuguesa”, Lusitana, Infantil e a Popular), ou a informação detalhada sobre as Universidades Populares do Porto, Coimbra, Vila Real e Póvoa de Varzim.
São autores como A. Aurélio da Costa Ferreira, Albano de Sousa, Alfredo Coelho de Magalhães, Álvaro Pinto, Amilcar de Mascarenhas, António Correia de Sousa, António Sérgio, Armando Cortesão, Artur Castilho, Augusto Casimiro, Augusto Martins, Eduardo Coelho, Fernando Salyart Pinto Ferreira, José G. de Santa-Ritta, José Teixeira Rego, Leonardo Coimbra, Luisa Sérgio, Oldemiro César, Teixeira de Pascoaes e Xavier de Carvalho que vão definir a orgânica da revista. No conjunto do boletim são estes os responsáveis pela elaboração dos artigos publicados exceptuando-se deste universo de 22 autores as personalidades que respondem aos inquéritos da revista, os jornalistas com artigos transcritos na Vida Portuguesa e os professores dos cursos efectuados nas Universidades Populares, cujos programas aparecem no quinzenário[8].
A escolha destes 22 homens, apesar de um percurso desigual dentro da revista, vai responder à ideia principal da «Renascença Portuguesa» O ênfase dado ao problema educativo inicia-se na experiência profissional destes articulistas: uma grande parte deles são professores, secundários ou universitários, é o caso de António Aurélio da Costa Ferreira, Alfredo Coelho de Magalhães, António Sérgio, Jaime Cortesão, Leonardo Coimbra, Teixeira de Pascoaes, Armando Cortesão, Augusto Casimiro, Eduardo Carneiro de Araújo Coelho, Fernando Salyart Pinto Ferreira, José Gonçalo da Costa de Santa Rita e José Teixeira Rego.
NOTA: agradeço ao doutor Luís Crespo de Andrade e doutora Isabel Câmara a revisão da análise sobre a "Vida Portuguesa".
[1] Podem encontrar todas as informações relativas à Vida Portuguesa (com analíticos feitos pela investigadora Adelaide Machado e não por mim), assim como as revistas: Alma Nacional, Estudos Sociais, Portugália, A Nação e Águia, trabalho efectuado pelos investigadores Sandra Lobo, Pedro Silva, Zília Osório de Castro, Paulo Oliveira e José Manuel Cordeiro, Adelaide Vieira Machado e João Paulo Monteiro e Isabel Câmara, respectivamente no site das Revista de História das Ideias (Ver aqui).
[2] Paulo Samuel, “A Águia e o movimento «Renascença Portuguesa», Revistas, Ideias e Doutrinas. Leituras do Pensamento Contemporâneo. Lisboa: Livros Horizonte, 2003, p. 129.
[3] O epíteto é de Jaime Cortesão definindo desta forma todos aqueles que vão participar da nova revista Vida Portuguesa – “Vida Portuguesa”, in A Vida Portuguesa, n.º 1, p. 1.
[4] É o caso de António Sérgio e Raul Proença.
[5] Teixeira de Pascoaes no seu manifesto “Ao Povo Português. Renascença Lusitana”, in IDEM, n.º 22, vol. II, p. 10-11.
[6] Vida Portuguesa, “Vida Portuguesa”, Jaime Cortesão, n.º 1 (31 de Outubro 1912), p. 1 e “Plano geral deste Boletim”, Idem, p. 7.
[7] Idem, p. 1
[8] Exceptuam-se assim do conjunto de autores os entrevistados F. Grandela, Pompeu de Faria, Francisco de Penalva Rocha, Aires de Carvalho, Álvaro Lemos, Micalef Pace, José Nunes da Mata (Inquérito Educativo), Xavier Esteves, Bento Carqueja, Bernardino Vareta (Inquérito Económico), os jornalistas como Phileas Lebesgue, do Mercure de France, C.F. de O Século, Rivera y Rovira, de El Poble Catalá, Luís Gonzaga, de O Jornal de Felgueiras, Rodrigo Davim de A Província do Algarve, António M. da Fonseca, de Gente Moça, Sotto Maior, de A Manhã, C. Afonso, Diário do Norte, Fran Paxeco, Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, Alberto Saavedra, Evolução, José Simões Coelho, O Século e os professores das Universidades Populares como João Diogo, José de Carvalho, Gonçalo Sampaio, Pedro Indiveri, Gustavo Ávila Peres e Adolfo Vasques Gomes. Não são estes os homens que vão construir a Vida Portuguesa já que não produzem nenhum artigo original que manifeste as preocupações da «Renascença Portuguesa».
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